Direitos humanos, decolonialidade e feminismo decolonial: ferramentas teóricas para a compreensão de raça e gênero nos locais de subalternidade

Rute Passos, Leticia Rocha Santos, Fran Espinoza

Resumo


Algumas vertentes teóricas têm se popularizado no campo das ciências sociais buscando identificar formas de compreender as diferenças marcadas pela raça e gênero e seus reflexos na sociedade. Contudo, observa-se que esses debates tendem a permanecer apenas entre seus pares, nos quais, dificilmente, os oprimidos e invisibilizados são ouvidos, lidos e referenciados em espaços acadêmicos, dentre outros espaços de privilégio. Portanto, o objetivo deste artigo é analisar como as vertentes teóricas decorrentes das teorias críticas dos direitos humanos e dos estudos decoloniais (feminismo decolonial), permitem a compreensão e visibilidade de diversas opressões em razão da raça e gênero, de maneira complementar e emancipatória. O problema de pesquisa questiona a possibilidade de se instrumentalizar essas ferramentas teóricas para emancipar pessoas em condições de subalternidade. Utiliza-se o método qualitativo, procedendo com a revisão bibliográfica através da metodologia relacional, trazendo o diálogo entre questões dogmáticas dos direitos humanos, dando ênfase a contribuições teóricas ainda pouco utilizadas nos estudos jurídicos, como os estudos decoloniais e o feminismo descolonial. Esse estudo apresenta o seu valor e originalidade por evidenciar a necessidade de mudar as lentes teóricas de interpretação, sobretudo nas questões relacionada a raça e gênero, cujas existências estão associadas aos direitos humanos e a colonialidade. Chega-se à conclusão de que o pensar de crítico e o reconhecimento dos aspectos coloniais nas mais básicas relações sociais permite que seja reconhecida a necessidade de ir além dos espaços acadêmicos e reconhecer outras epistemes e projetos de luta e resistência.

Palavras-chave


Decolonialidade; Direitos Humanos; Gênero. Raça; Subalternidade.

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DOI: https://doi.org/10.5102/rbpp.v10i2.6877

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